terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Intitulável

mente inquieta
arte na pele
risos no ar
imã de loucura
asas sem voar

feridas expostas
esperanças impostas
restos de vida
nada contra a correnteza
amor incalculável
natureza irrefreável
delicadeza na flor
ardor nos espinhos

mestre dos disfarces
orfão do acaso
liberdade em cheque
esposa do espaço
restos do começo
outrora esmaecida

languidez dos fios
olhos em brasa
verdades livres
erros passantes
retornos estranhos
respostas inesperadas
águas de dúvida



Meu, para o mundo.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Faltam as Palavras

tem sempre um dia na vida que as palavras faltam.

faltam por serem apenas palavras e pelo significado incrustado nelas seja meramente insignificante a ponto de poder ser usado para determinar um instante, para exprimir um sentimento, uma vontade, um desejo. Uma ânsia. Aquela de viver. não alucinado. não. aquela de buscar o que crê ser possível conquistar. aquela ânsia que dá borboletas no estômago e desperta a faceta ambiciosa adormecida dentro de cada um de nós.

as palavras faltam quando mais são necessárias.

faltam naquele momento que você precisa laurear alguém, consolar um amigo por uma perda grave, que vai transformar a vida dele, sendo que o caminho da perda é cumprido e demora a sua regeneração. faltam as palavras naqueles momentos de felicidade, de êxtase. falta a palavra que dá vida ao grito guardado e acorrentado no mais profundo canto da alma. faltam as palavras para dizer o quanto certa pessoa é importante, inclusive, este momento, mesmo que se tenha as palavras que achas certas, o medo e a incerteza da receptividade calam as palavras, sem saber se aquele momento seria o único para tal intenção.

faltam as palavras em muitos momentos.

quando pensa-se que o xingamento é a única forma de expressão válida. quando passa-se por uma situação de stress que culmina em ira, depois de ter aguentado afrontamentos, apontadas de dedo, humilhação e ser taxado de algo que de fato não o é.

faltam as palavras cada vez mais.

para divulgar as verdades que as pessoas têm medo de dizer. para calar os opressores e denunciar os corruptos.

faltam as palavras certas para os momentos oportunos.

para valorizar os seus direitos e lutar pelos direitos de quem precisa de apoio, de um braço amigo e de um ombro irmão.

faltam as palavras para defender os ideais.

ideais que outros deram suas vidas para defender e que hoje são esquecidos pelo comodismo, pela facilitude com que a vida proporciona as regalias, entrega as dificuldades prontas e de mão beijada, exigindo pouco do potencial de cada um, pouco do que realmente dignificaria o homem.

faltam as palavras de ordem e progresso.

estampadas na bandeira de um país que tem tudo para ser o futuro, para ser uma potência, e é visto a olhos estrangeiros como um país de terceiro mundo, sub desenvolvido e subserviente, por mais que um gorducho rechonchudo vá na TV e dê mãos e sorrisos para presidentes, coordenadores, conselheiros e o escambau a quatro.

faltam as palavras.

e sempre faltarão.



Meu, para o mundo.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Falta-se Parecer

parece faltar tato.
parece faltar intimidade.
parece faltar generosidade.
parece faltar. e faltar cada vez mais.
falta-se cada dia mais.
falta-se às escolas.
falta-se às casas. aos apartamentos.
falta-se. fere-se.
fere-se as pessoas.
fere-se os animais.
fere-se as plantas. silêncio.
falta-se silêncio na selva.
falta-se e fere-se na selva, sempre.
selva-se na cidade, fere-se nas casas.
silêncio na falta.
parece que falta sempre.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Frágil Tempo Veloz

uma atitude pode arruinar um começo? começo de quê? mais uma incerteza que rola pela sarjeta num dia mais comum que qualquer outro. certeza. a única certeza que existe é que nada é certo, além daquele papo ultrapassado de morte e impostos. os mortos pagam seus impostos também, mas a Receita Federal dever ser meio diferente lá no Céu, ou no Inferno. Tudo depende. De uma vida vivida dentro dos padrões ou se totalmente fora do quadrado delimitado assim que o médico corta o cordão umbilical. um quadrado mascarado por dias de céu azulados e nuvens brancas, e por dias rubros e obscuros, embaçados pelos olhares fumegantes dos outros. mas a vida é assim: chega sem avisar e passa sem nem perceber sua existência. logo, você está moído pelo tempo e abatido pela vida. o brilho e ternura somem do olhar, a pele enrugada pelo sol escaldante, tudo igual. quem tem 10 hoje amanhã tem 58. quem tem 58, quer viver como se tivesse 18, mas morre com 60 por causa dos excessos. a velocidade da idade é relativamente proporcional ao que você faz da sua vida. você pode viver 30 anos como se vivesse 70, ou pode viver 90 como se vivesse 20. o tempo muda as personalidades, delineia o caráter, mas não muda uma coisa: a fragilidade da carne.



Meu, para o mundo.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Não Custa

é das alturas que vem a liberdade. de ir e vir. de andar para trás, pelo revesso, na expessura fina da linha bamba da vida. rindo ao caminhar, sem olhar para o que passou, focado no futuro estampado na retina do olhar, sem preocupações, sem ligações de cobrança de bancos, de amigos saudosistas que não sabem viver bem na companhia de si mesmos.

liberdade que muitos sonham, todos querem e quase nenhum tem. a vida leve, altiva e sincera de um nômade notívago, dormindo nos bancos dos parques da vida, levantando com sustos de guardas e pessoas aleatórias. banhando-se nas fontes públicas de águas límpidas e potáveis.

persistir por um amanhã pleno, entalhado na madeira mais nobre, da casa mais alta, do pico mais afastado, na montanha mais gelada, do continente mais remoto, de uma vida que não chegou ainda a existir.

liberdade do futuro desprendido de responsabilidades e de amores infinitos sob o manto azul do mar.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Tanto que Sinto

apenas sentar ao lado
mãos dadas, escoradas pelo gramado
sorrisos abertos,
escancarados às luzes da ribalta,
incandescentes, indecentes,
tremeluzentes,
palpitações intermitentes,
braços arrepiados,
pálidos de amor,
captados pelas lentes claras
apoiando-se em situações raras.
continuados, mesmo separados.
calados, lado a lado,
simplesmente sentados.
conjugados, dedos inter-calados.
meus olhos inebriados.
seu sorriso espalhafatoso,
amável, sinuoso.
amoroso.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Na Garrafa

no além mar está o objeto de desejo,
boiando nas enconstas do Atlântico,
viajando e voltando dos recantos longínquos dos sete mares,
a espera contínua pelo seio terrestre,
o anseio das vozes ao pé do ouvido.
duas mãos agarram-na fortemente,
um som abafado anuncia a violação do lacre.
batidas abafadas pela quebra das ondas,
grãos espalham-se ainda mais sob os pés,
uma folha é desenrolada,
um abraço apertado
a distância irrelevante
aproxima ainda mais.
os olhos passam rapidamente pela folha
“Saudade.”
olhar marejado,
recado dado.


Meu, para o mundo.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Aquele Vestido

as luzes apagadas na casa
uma garrafa em mãos,
semi quente, metade vazia,
verde reluzente.
combinava com uma listra do seu vestido.
“cubista”, pensei. fã de Picasso,
me indaguei.
quase falei.
mas hesitei.
petrificado pela visão,
perdido em sensações
suor nas mãos,
outra vez aquela antiga palpitação.
foi apenas um sopro.
aquele susto momentâneo,
quando os pulmões inflam.
ar rarefeito adentra,
nada sai.



Meu, para o mundo.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Novo, de Novo.

mais um recomeço.
mais um ponto de partida.
mais um retrocesso.

mais uma perdida pelo caminho.
mais uma indefinida.
mais uma largada na contramão da vida.

mais uma vez.
sempre outra vez.
repete-se a vez,
e a vez repete-se.

de novo. e de novo.
em busca, sempre,
de mais um novo.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

#200

fazia tempo que não sentava.
sentava e sentia, me permitia.
fazia alguns dias que não a via,
radiante, ofuscante, bela.
nos meus olhos, ardia.
adia o peito estufado,
a lufada de ar engasgada,
o sopro encantado, o braço encostado,
coração escorado. de canto, ao relento.
me permitia sentir tudo novamente,
outra vez, mais pulsante, medroso e transpirante.
dominical circunstância. discrepância de épocas.
sensações e sentimentos passados, à tona
empregados.
pretérito perfeito do futuro presente.
latente. doente.
em mente ausente.



Meu, para o mundo.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

#7

os dedos em ritmo acelerado começaram a diminuir o tamborilar nas teclas. o silêncio começou a predominar no recinto. a música batendo em seu martelo foi cessando. silêncio total. o fone ficou acoplado em suas orelhas, como de costume. as nuances continuavam a ressoar em seu tímpano, fazendo-o cantarolar mentalmente as letras, acompanhando sua tentativa de canto com o balanço de sua cabeça para esquerda, para esquerda novamente, e fazendo o mesmo no sentido contrário. permaneceu assim por alguns instantes. sensação de dever cumprido e comprido. foram muitos dias sentado em frente ao computador, com sua mão repousada sobre as teclas, esperando o primeiro estalo do que poderia ser mais um verso, uma estrofe completa com rimas - mesmo não sendo esta sua preferência. estalos diferentes daqueles sonoros feitos com os dedos. esses, ele deixava para utilizar como acompanhamento nas músicas. pensou em recolher suas coisas espalhadas pela casa. canetas jogadas na mesa da copa, uma infinidade de cores. tinha-as sem saber porquê, usava sempre a azul e a preta, mas nunca até a último suspiro de tinta, sempre perdia-as no decorrer do trajeto entre o quarto e a sala, mas temia que fosse um ladrão imaginário quem as roubasse. abstraiu o pensamento e continuou pensando na arrumação. tinha uma mala para guardar todos os seus pertences, inclusive a muda de roupa que estava lavada, mas não pronta, sobre a máquina de lavar na lavanderia, esta que ficava nos fundos da casa, em um casebre anexo. deixou as roupas por último, na mala talvez não coubessem-nas de modo ordenado. preferiu embalar em plástico bolha a caneca com dizeres em latim que havia adquirido em um site de materiais para escritório. levava-a para todos os cantos, inclusive nas viagens aos finais de semana para a praia. estar bebendo da caneca com aqueles dizeres fazia-o sentir-se bem, conhecedor de uma época que sonhava desde criança ter vivenciado e experenciado. os discursos nas ágoras, as tardes junto aos escribas. as letras sempre o fascinaram, desde menino. o primeiro livro lembra até hoje: Os 12 Trabalhos de Hércules, de Monteiro Lobato. o mundo épico fazia sua mente divagar, imaginar cada detalhe daquela história fantástica, digna de um filme a la Ben Hur. daquele dia em frente, sua vida não foi mais a mesma. a frequência aumentou para 1 livro por mês, sua leitura ainda não era tão dinâmica e utilizava o dicionário para pesquisar o significado de palavras truncadas e rebuscadas. com o vocabulário enriquecido e o avanço da idade, a média aumentou para 2 livros por mês, independente do tamanho, da intensidade e profundidade do vocabulário. com o passar do tempo, foi incorporando métodos a sua leitura, circulava palavras à lápis para pesquisar no dicionário, transcrevia-as para o computador em um arquivo intitulado “vocabulário”, este sempre exposto na área de trabalho. os livros inspiravam-no enormemente. cada história dava-lhe ideias para escrever a sua. a linguagem e rapidez de narrativa dos autores acabou por doutrinar sua forma de escrever. os livros. lembrou dos livros espalhados pela casa. Goethe no rack da sala ao lado da TV, Descartes na mesinha de centro da sala, próximo a “A Divina Comédia”, com algumas cinzas de cigarro batidas sobre a capa. No seu quarto, o criado mudo quase falava, de tantos livros que absorveu durante os anos em que ele habitou a casa. passaram grandes escritores: Saramago, Nietzsche, Rodrigues, Vianco, Marques, Rosa, Andrades entre tantos outros. abriu a gaveta e encontrou um que estava perdido há anos: a versão de bolso de “O Jogador” de Dostoiévski. tento tempo que não revia a capa do livro, a foto que a ilustrava era uma mesa redonda, com um pano de feltro verde cobrindo-a, algumas cartas espalhadas pela mesma e uma pilha considerável de fichas das mais variadas cores: vermelhas, verdes, azuis, pretas, brancas. uma coisa lembrava outra que o fazia recordar que precisava procurar ainda muitas coisas espalhadas pela casa. lembrou da sua maleta de fichas de poker que levava para os encontros semanais com os amigos, que o lembrou de procurar o deck de cartas que um de seus grandes amigos lhe trouxe de Las Vegas, que o lembrou de procurar a toalha de feltro que usavam nas jogatinas madrugada a dentro, que o lembrou de procurar os porta-copos que usavam para não manchar a mesa de mogno que o proprietário da casa tanto adorava, praticamente venerava. é um pedaço de madeira maciça, mas nunca contradisse o dono, afinal, foi uma das poucas exigências feitas pelo senhor de 74 anos, que o lembrou de colocar na mala a garrafa de whisky que seu pai lhe deu quando voltou da escócia. 12 anos, single malte. a única que sobrou ainda lacrada. muitas lembranças, muitos pertences espelhados pela casa inteira. de certo ia esquecer alguma coisa, e inevitavelmente não voltaria para recuperá-la. ainda de fones, sim, sem estar plugado em nada, nem mesmo no ipod que estava em seu bolso, continuou perambulando pela casa lembrando dos amores, das mulheres, das festas, das badernas, das reclamações dos vizinhos, do aconchego, das visitas de sua mãe que sempre trazia comida, as que ele comprava eram em sua maioria congeladas, das conversas com o pai enquanto apreciavam um copo de whisky e um charuto, das discussões com as namoradas e do sexo que vinha logo em seguida, que deixava marcas, arranhões e hematomas em algumas vezes, das brigas com o vizinho do lado, das noites em claro que passou no sofá com os olhos semi cerrados e as crescentes olheiras. resolveu colocar um som em seus ouvidos para amansar a ansiedade e tranquilizar a mente irriquieta. enquanto o jazz entoava o seu andar, foi ajeitando a mala em suas costas, com poucas coisas, o prazo limite para retirar tudo era na sexta e começou cedo, no domingo que antecedia o prazo. o tempo não urgia, mas corria feito um guepardo. apagou a luz, passou a chave na porta pela antipenúltima vez e seguiu rumo à liberdade.



Meu, para o mundo.

domingo, 29 de agosto de 2010

Passado à porta

a cabeça solta em pensamentos
ela toma conta de todos eles.
ela novamente, ela, a nova.
em si, renovada.

pensamentos convergentes,
incessantes, levemente assustados.

análise do passado em pleno presente
passado este recente,
a tona, mais uma vez.
sentes.



Meu, para o mundo.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Não Está nos Livros

sem receitas
sem direita nem esquerda.

bom dia pra sorrir,
olhar nos olhos,a
palavras belas e fugir.

belo dia para começar de novo,
lembrar-se que foi, passou.
limpar e continuar.

bom dia para chorar,
sem tristezas, medos.
espantar as dúvidas.
levantar.



Meu, para o mundo.

domingo, 22 de agosto de 2010

Nota Mental

quero correr daqui, parar ali na frente, pular no banco da rua com a tinta ainda fresca, sapatear e deixar as estrias do meu all star marcadas nele. branca. tomara que a tinta seja branca, igual naqueles filmes quando o cara senta no banco e não percebe o papel fixado na madeira dizendo: “Não sente. Tinta fresca.” engraçado, né? as coisas mais simples e bobas às vezes são as que nos fazem mais felizes.



Meu, para o mundo.

sábado, 14 de agosto de 2010

Pilha de Fotos

Passaram-se dias. A pilha de fotos aumentava exponecialmente, a pilha de sentimentos crescia e já escorria pelo tapete encardido embaixo da mesa de centro. As fotos eram de vinte, quarenta anos, sessenta anos atrás. As viagens, as paisagens, os beijos. Uma infinidade de olhares. Uma eternidade de mãos entrelaçadas, sorrisos trocados. Um sem fim de países visitados, de pontos turísticos registrados em quilômetros de rolos de filme 35mm. Tudo parece distante agora. Cada cílio fechado, cada pedaço de roupa trocada, tocada. Cada abraço dado e desfeito em questão de segundos. O passado voltou para assombrar como sempre, é do seu feitio. As fotos vão desmoronando. Pouco a pouco, como uma cachoeira em câmera lenta, é passível evitar sua queda e a colisão iminente. Tudo ao redor para, congela-se. Ficou para um próximo segundo. Um próximo sorriso aberto por um abraço dado e um beijo estalado na bochecha esquerda. Ficou para uma próxima vida, não tão longe, mas nem um pouco próxima. A vida seguiu, assim como as fotos que caíram. Foi um curso-colisão-rota inevitável, irrefreável.
A pilha desmorona aos poucos. As cores ficam turvas, fundem-se, viram um pastel-azulado-com-toques-alaranjados. Os pés tocam os cabelos, as mãos mesclam-se com a cintura-violão da loira, os olhos agora são o nariz de cada um, solto no espaço. Seguiu-se o trajeto. As histórias sem envolvem, evoluem, dissolvem como tinta na água, homogêneas como água com açúcar. Restaram as alianças soltas. Sem dedos para formar um par. Um casal entregue ao sucesso, rumando de encontro ao fracasso de um amor etéreo. Fim antes de ter saído do papel. Ficaram as lentes de contato expostas tempo demais, ou ambos cegaram-se com tanto sentimento? O futuro chegou cedo demais, ou eles envelheceram e desenvolveram tantas manias insuportáveis que o presente virou passado?
Metade da rota de colisão com o tapete encardido embaixo da mesa de centro. Algumas fotos são paradas pelo tampo de vidro da mesa. O peso delas trinca o vidro. Encobrem os livros, as folhas com textos velhos manchados de café. Derrubam latas de energético vazias, tombam amores, estraçalham horrores e temores. Ficam marcadas de cinzas de cigarro. Acendem charutos, servem de combustível pra lareira do coração. Cada pedaço de papel com tinta marcada gerou um registro indelével, indefectível. Doloroso. Agora, dolorido. Restou a marca, o crivo da verdade nua e crua no coração pulsante.
Colisão completa. Resultado da batida: 1 coração quebrado. 1 mente perturbada. 12.403 fotos derramdas, como vinho, sobre o tapete encardido.



Meu, para o mundo.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Caindo

Bem fundo,
Profundo,
Mundo guardado a espera
Do amanhã, do domingo.
O sol varando a janela,
O controle na mão,
Canal. Sorriso,
Abraço e mãos,
Coração em coração
Lábios selados,
Juntados, amados.
A mesma marca,
Dedos iguais em extensões distintas,
Conectados, separados pelo físico,
Unidos em astrológico.
Olhar profundo,
Passagem para um novo mundo.



Meu, para o mundo.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

para recomeçar

juntei minha pilha de papéis
rabiscados, amassados,
gostas d’água espalhadas.
a caneta com meio carga
e tampa mastigada até o osso,
recolhi meus cabos digitais
e arquivos físicos.
empacotei os documentos
em pastas de madeira,
envelopei as máscaras,
aquelas que vestia diariamente.
abri a porta de saída,
olhei pra trás.
a última observada sincera,
o último sorriso honesto.
o chaveiro tilintava no meu bolso.
irônico. a menor chave
era a mais pesada.
destarrachei-a da argola,
coloquei no pote.
bati a porta atrás de mim.
fui ser feliz.
respirar.



Meu, para o mundo

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Imperceptível

a mente transformou em linha.
fina, de linho. fio do frio,
no horizonte sem fim
distante da boca,
contíguo ao sim de lá.
teceu a metástase,
ordenou o ataque
raso transmutado em coronel,
chefe do rebanho,
matilha do bordel,
cabeça a prêmio,
desleal infiel,
degolado no paço
cabos no percalço,
seu torniquete frouxo,
sem fita para laço.
fim da linha rósea,
enrubecida faixa em meio fio,
encharcado de água,
lágrimas do céus,
- não! é o começo da minha,
fim da sina,
meio da raposa,
da rapina.
corta-se a linha fina.



Meu, para o mundo.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

A Caminho da Sessão

Fazia tempo que não abria o documento para escrever. Melhor ainda, o documento sempre esteve aberto, em branco, nos últimos 20 dias. Mesmo período em que seu laptop permanecia, heroicamente, ligado. E plugado na fonte carregadora. Se isso iria resultar em danos e futuras manutenções não importava, o que ele queria era ter acesso às suas coisas quando bem entendesse. Menos aos programas de mensagem instantânea. O círculo azul na barra de ferramentas e os números em seu celular para envio de sms já eram mais que suficientes. Auto-suficiente. Intrasigente desde sempre. Meio isolado do resto do mundo, recebia convites pelas redes sociais, nunca dando um parecer se iria ou não comparecer às festas e aos eventos que era convidado. O checkbox eram sempre ticados, mas não deveriam ser levados tão a sério pelas pessoas. Ticava para brincar, ocupar seu tempo livre e sua mente incessante com coisas triviais acalmava sua alma e deixava seu ânimo equilibrado, sem correr riscos de cair em depressão e sem racionalizar demais sobre a vida.
Partia de um lado para o outro da casa, lotada de roupas, lotadas de brinquedos, de toys, de espaço livre para muito mais coisas que iria comprar. “Consumismo consumindo o consumo do consumista”, disse ele para si mesmo, enquanto escrevia tais dizeres na parede ao lado da porta de entrada, que dava de frente para o balcão da cozinha. Sua estante de livros, arqueada, evidenciava que um reforço em questão de semanas seria necessário para prevenir um desastre iminente. O post-it na geladeira jazia com a anotação: Comprar parafusos, ou o que quer que seja o nome do material que dê reforço à estante. Abriu a geladeira, serviu-se do suco de laranja, que obviamente já estava no final da caixa, obrigando-o a tomar apenas metade da metade de um copo, o que lembrou-o de outro problema: o estoque de comida estava chegando ao final, teria que sair para comprar comida, suco, frios e mais algumas coisas que encontrasse no mercado. TInha parado de beber, então seu custo mensal de alimentação e bebidas tinha descrescido consideravelmente, além do seu físico ter melhorado significativamente. Fechou a porta da geladeira, não antes de pegar um pedaço de queijo e um de presunto e fazer um rolinho para comer. A porta bateu enquanto batiam na outra porta. “Vai, cara. Levanta essa bunda do sofá.” “Merda, sempre esqueço de arrumar a campainha. Já vai.” Antes de atender, escreveu em outro post-it, que afixou na borda da TV: “Consertar campainha.” “E aí, como que tá? Tá pronto?” “Tranquilo, meu querido. Pronto pra quê?” “O cinema. Esqueceu? É daqui 30 minutos.” “Me dá 5 que já saímos.” “Merda. Ok.” Nunca tomou um banho tão rápido em toda sua vida. Em menos de 5 já estava fora do banho, e em questão de mais 1 minuto acrescido ao timer estava pronto, fechando a porta do apartamento. Sua mão esgueirou-se pra puxar a chave geral que desligava todas as luzes, deixando apenas a geladeira em funcionamento. Dica do seu chefe. “Sábio”, pensou novamente consigo mesmo.
Descendo as escadas do 2º até o térreo, seu telefone tocou.

“Namorada” dizia o display. Toque do celular: The Album Leaf / Always For You

“Oi. Tudo bem?”



Meu, para o mundo.

sábado, 31 de julho de 2010

ancorador de auras

a tela mais branca,
o relógio menos irritante,
a mente, sempre incessante.

começa-se pelo fim do dia,
termina-se no meio da noite,
vê-se perto o distante.
brilhante.

cada passo em frente
uma alma deixada na sola,

solta pelo corredor de luzes,
envoltas em plástico bolha,
simples pra não machucar.

passo apertado,
ritmo surdo, assimétrico.

perdido.
porto seguro alfa.
hangar beta.

ômega.



Meu, para o mundo.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Fardo Diário

Seus berros, seu sermão.
Seus insultos.
Contramão.

Longe dos fatos,
Distante de atos
Perto da porta da rua.
Fora do eixo.
Olhe ao seu lado,
Os poucos que restam,
Te detestam, agouram-te.

Reflita ao abrir os olhos.
Enxergue-se além,
Não seja aquém.
Distante dos atos,
Você é um fardo.
Fato.



Meu, para o mundo.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Claro a Dentro

Insônia maldita.
Sono perdido.
Mais uma noite em claro
Fones no ouvido.

Lentidão rítmica dos pensamentos.
Intransigentes. Exigentes.
Initeligíveis. (Ininteligentes).

Cansado do presente passado,
Sentado, espera a recusa.

Mais cem anos aprisionado
no corpo do malfeitor alado.

Duzentas noites perdidas
para as madrugadas claras.



Meu, para o mundo.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Anciões e Sábios

A diferença.
A displicência.
A diferença.
A resiliência.
A transferência.
A impaciência.
A esperança.
A paciência.
A indiferença.
A ciência.
A justiça.
A sapiência.

A essência.



Meu, para o mundo.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Lápis na Folha

O lápis corta as linhas,
Finas, elegantes, silhuetas do caderno.

Belas letras, traços ligeiros,
Respingos de tinta.

Tinteiro melado,
Transbordando ideias e sentimentos.

Sentimentos traçados,
I’s devidamente pingados.

Prévia do final da história,
Começo da relação,
Meio da emoção.



Meu, para o mundo.

domingo, 4 de julho de 2010

Oferta Desfeita

A mão lhe foi estendida,
Oferenda feita, retida.
Nada de clemência ao pecador.
Resta-lhe a dor, o ardor.
Nada passa de temor.
Sua veia de ator, seu lado encantador
Deflagrado pelo recanto.
Sem mais jardins,
Finito de lírios, sopros e alívios.
Tradicional ímpeto furioso.
Assombro da perdição,
Causador maléfico dos sonhos.
Chora pelo amanhã preterido,
Ajoelhe-se perante o presente fundido.
Forjando seu anel de prata,
Liga da matéria mais lasciva.
Coração envenenado pela beleza,
Louros nocivos ao Ego,
Aprazíveis ao ID,
Abandonados pelo Super.



Meu, para o mundo

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Por quê, Nação?

O verde bandeira da flâmula
Brilho da fauna patriota,
Sinal de vida inteligente,
Vida sinalizante, recorrente,
Bela e traumatizada.
Mescla de losângo amarelo,
Inteiro, vasto em dimensão,
Pequeno para tanta terra.
Liberdade e progresso na faixa azul,
Símbolo de esperança e ordem.
Imerso em desordem,
Cúmplice dos temerários engravatados,
Aliado dos grandes corruptos.
Brilha apenas Uma.
Ofuscam as outras Vinte e Seis.
Pátria amada, idolatrada,
Decadente. Levemente senil.



Meu, para o mundo.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Chegou a Vez Mais Uma Vez

Chegou a vez do coração bater novamente. Ritmado, em clima de Carnaval. Público lotado, cadeiras recheada. A plateia não consegue respirar de tão lotada. Não se tem como levantar os braços para comemorar ou soltar aquele grito engasgado na garganta. Só resta sorrir. Mostrar os dentes para o horizonte sem fim, enfim, feliz no interím.

Chegou a vez dos pulmões respirarem leves novamente. Lufados e estufados pelo ar puro das planícies selvagens, habitadas por animais campestres regozijantes em tamanha relva recém-descoberta por aqueles pulmões virgens. Ao fundo, ouvem-se as quedas da cachoeira que sua alma há tanto sonhava em reencontrar. Perímetro inviolável da natureza, agora violado pela felicidade de seus aovéolos e brônquios.

Chegou a vez dos olhos marejarem de felicidade novamente. Felicidade por ter encontrado outrém em mesma situação. Felicidade por ter seu espírito tranquilizado e afagado por braços firmes e por um coração amolecido esplendoroso. Demorou tempo suficiente para seu corpo tomar sua forma antiga e preparar o terreno da alma e estar receptivo às influências externas mais uma vez. Os olhos agora têm outra menina. As íris detectam cores há muito apagadas, e há pouco re-descobertas. A retina brilha, cintilante, como a primeira estrela a dar o ar da graça no céu quando a noite nasce, avivando a claridade no coração dos apaixonados. A luz da Lua é ofuscada por estes olhos novos, vívidos. Altivos. Agora, reativos.

Chegou a vez das mãos transpirarem novamente. Ansiedade à flor da pele. As transpiração atrapalha no digitar, mas empolga, por saber que muito mais dela vem aí. E junto, aquele palpitar desenfreado, quase taquicardiáco. Junto a ela, vem muito mais, vem o frio na barriga, o medo de pisar em falso, o medo de errar, dizer alguma palavra que vire o rosto, que quebre o encanto. Comedido. A transpiração comedida sem medida, feita sob medida para este novo momento.

Chegou a vez de ser o da vez novamente. O da vez para alguém especial, aquele alguém que precisava justamente deste outro apagado. A vez de sorrir com o raiar do sol, de madrugar por aí, sem rumo, deixando para trás qualquer documento que lhe prenda ao passado. A vez de novos escritos, de novas frases, inventadas, nunca reutilizadas. A vez de ser completo. O quebra-cabeça finalizado, preparado para ser pendurado na parede, não como prêmio, mas como obra. Arte em seu primor. Apenas.

Chegou a vez mais uma vez.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Abrir. Fechar.

Abriu os olhos para o raiar,
Abriu a janela para o sol,
Abriu a cortina para o domingo,
Abriu o coração e deu abrigo.

Fechou a cortina para a lua,
Fechou a janela para rebater o frio,
Apagou as luzes para sonhar
Cerrou os olhos para amar.



Meu, para o mundo.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Frame por Frame

Os dias começavam cedo. Saía da cama por volta das 4:45, todos os dias. Tinha sono leve. Qualquer respiração mais profunda ou um suspirar mais intenso o acordava. Tinha um hábito odiado por todos os que moravam com ele: sempre que chegava em casa, de qualquer lugar, colocava seu iPod no dockstation e ligava-o.

Assim que saía da cama desligava o iPod que tinha passado as últimas 2 horas tocando incessantemente. Coçou o cabelo como faz rotineiramente, entrou no banheiro, trancou a porta, jogou uma água no rosto. Ligou o chuveiro e deixou-o esquentar enquanto se despia.

TOC. Transtorno obssessivo compulsivo. Tinha esse mal também. Fazia as mesmas coisas durante o banho. Lavava a axila esquerda e depois a direita. Descia para as pernas, subia para o pescoço, descia para a pélvis. O cabelo era a última parte a ser ensaboada, não com sabonete, obviamente.

Saía do box depois de 10 minutos, aproximadamente, enxugava-se, tirava a escova de dentes do pote, passava a pasta de dente e começa a rotina da escovação. Esquerda, direita, em cima, embaixo, no fundo, os da frente. Bochechava duas vezes, enxugava os lábios e depois sorvia um belo gole de antiséptico bucal. Gargarejava por uns 2 minutos, conforme instruções na embalagem, seus olhos sempre lacrimejavam por causa do álcool na composição. Enxugava os olhos com os dedos indicadores, cuspia o líquido na pia, abria a torneira para limpar o que havia sobrado e saí do banheiro. Apagava a luz.

Ficava uns 2 minutos olhando para o seu armário sem portas, com todas as roupas expostas e alinhadas, como um pelotão do exército esperando a ordem do capitão sobre o passa a seguir.

Cuecas na segunda gaveta. Meias na primeira. Pertences aleatórios e bugigangas na terceira. Na quarta, ele guardava o seu passado. Cuecas pretas, apenas. Prefere assim. E em toda viagem de ano novo, tinha que comprar uma cueca branca para passar a transição do ano. Sempre a mesma ladainha, mas respeitava o significado. Preto tem sido sua cor favorita nos últimos tempos. Até no sol, ele sai de preto. Camiseta. E se arrepende assim que o sol bate no seu braço pendurado para fora do carro, em cima da manga preta. Ovo. Resume bem o que ele sente no momento, o calor a cor retém é passível de se fritar um ovo. Gema mole talvez, para molhar o pão francês.

Mal humorado pela manhã, evita manter diálogo com seus colegas de trabalho até o almoço. Sempre sai de casa sem tomar café. No máximo abre uma lata de Red Bull e vai tomando no carro. Os 2 últimos anos, elas, as latas, têm sido suas fiéis companheiras. Jogadas pelo carro, espalhadas por todos os cômodos do apartamento, mas, em demasia, empilhadas na parede de seu quarto. Se bobear até no banheiro deve ter uma. Mas não lembra com exatidão neste momento.

O dia passa devagar. E mais a cada dia, insatisfação pessoal. Quer dar uma reviravolta em sua vida, quebras os padrões, deixar os sentimentos e as ideias realmente fluirem. Não quer dar satisfação para sua namorada, nem para ninguém. As ligações às vezes são infinitas em sua percepção. Bastam 2 minutos: “Oi, tudo bem?” “Tudo e com você?” “Tranquilo.” “Saudade. Não te vejo desde sábado. Já é quinta. Vem me ver?” “Claro. Assim que sair, te dou um toque. Te amo.” “Eu também te amo.” “Beijos, linda.” Suspiros. O celular em sua mão fica mudo. Essa é a ligação perfeita. Sem enrolação, breve, porém sincera. Verdadeira. Amável.

Volta para a lente da câmera. Fotos e mais fotos. Descarregava o memory stick no computador. Selecionar as fotos é a parte mais gratificante, consegue avaliar o que fez de errado em cada foto, onde acertou na iluminação, onde pode melhorar quando for fazer o tratamento. Duas horas para concluir a transferência. “Foto pra caralho!”, pensa ele enquanto abre o iTunes.

Sua playlist é ridiculamente gigante, mas acaba sempre escutando as mesmas bandas, e as mesmas músicas das mesmas bandas. Cumpre todo o alfabeto, mas não ouve nem metade das letras. Tem preferência pela P, M, S, L. Cochila na cadeira. Começa a viajar, seu pensamento vai longe, entra em alpha, quando menos não vê, tá sonhando. Seus pés andam sobre a água do Lago do Ibirapuera. “Não é possível. Nem cristão eu sou. Como que posso estar aqui? Assim?” Registra o momento com uma foto, sua câmera sempre em posição e pronta para o disparo. Uma rajada de cliques. “Consigo montar uma panorâmica, se bobear.”

(Fyfe Dangerfield / When You Walk In the Room)

Susto. Estrondo. Cadeira no chão. Ele acorda desesperado. Respiração ofegante. Demora até cair em si de que seu celular está tocando. Ele começa a sambar sobre a mesa, enquanto a música embala, ritmicamente, o trepidar do aparelho no tampão de vidro.

(Display do celular - .... Namorada)

“Oi, amor”.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Colcha de Retalhos

Faz tempo que não te escrevo nada, sei disso, mas foi uma escolha minha. Nossos desentendimentos, mesmo sem relacionamento, já não estava me fazendo bem. Você continua seguindo sua vida, e eu a minha. Cada um em perfeita sinergia com as vibrações que planta, será melhor assim, tanto pra você quanto pra mim.

Seus olhos não passam de fotografias já desbotadas na minha mente imemorial. Seu sorriso ficou amarelo, como um aro de bicicleta que com o passar dos anos e a ação do tempo cria a ferrugem e desgasta o que antes era belo e cintilante.

Seus cabelos agora estão mais compridos, talvez mais louros, não sei.

A última vez que te vi, continuava bela, como sempre fostes, desde o nosso primeiro encontro no jardim botânico, rodeado por tantas flores, tanto verde, tanta pureza no ar. Nada tirava-me a atenção. Só parecia existir você dentro daquele parque amazônico, onde tudo fundia-se em completa harmonia. O farfalhar de cada folha daquele recinto soava como a mais maravilhosa orquestra sinfônica. Cada brisa que tocava meu rosto era um novo sopro de vida, que enchia de alegria meus pulmões já prejudicados pela minha vida de excessos.

Tem muito tempo que isso aconteceu. Hoje já não somos mais aquelas mesmas pessoas felizes e que compreendiam o que se passava na vida de ambas. Não somos mais aquele casal contente, que inspirava os outros a ser como nós. Não somos mais uma só pessoa, uma entidade contígua. Hoje, somos eu e você, separados pela ação do tempo e por acasos não feitos ao acaso. Hoje, queria que fosse o ano que vem, para que a velocidade com que o espaço-tempo passaria apagasse de minha memória teimosa a sua imagem, seus sorrisos, seus abraços, seus beijos e acalentos, suas palavras doces sussurradas ao pé do meu ouvido durante noites calorosas.

As juras de amor desfizeram-se perante os anos que se passaram. Seus gestos mostram uma faceta sua antes desconhecida pela minha visão, pelo meu coração. O que os olhos não veem o coração continua a sentir da mesma maneira. Ditos populares não servem de apoio ao que eu tenho passado, e nem são as palavras do mais chegados que vão fazer com o que os pedaços de vidro quebrados dentro de mim sejam colados, ou sequer recolhidos.

Existe muito aqui que ainda precisa ser dito, ou ao menos mostrado pra você. Não sei por onde começar, e nem como fazer você ver.

É complicado aprender a caminhar com as próprias pernas.

Dias a fio roguei por você, indaguei o porquê das coisas terem transcorrido como transcorreram, e sei que no final, quem causou tudo o estardalhaço é aquele que hoje sente em suas entranhas o cravar das lâminas afiadas da solidão.

Superar não tem sido fácil, nem tem sido agradável. Tem mostrado-se cada vez mais difícil, em um mundo frio e cada dia mais gélido com o chegar do inverno, aquecer o corpo é a tarefa mais simples, acenda uma lareira ou acolha-se embaixo de um edredon ou cobertor, agasalhe-se e o calor se encarrega de fazer sua função, de prevenir doenças, impedir a queda térmica do corpo. O problema é aquecer a alma, avivar o coração, manter acesa a chama que um dia apagou-se pelas atitudes drásticas e imaturas tomadas pelo lado infantiil da relação amorosa. Isso nem o tempo, nem as pessoas, nem nobres palavras e gestos aventureiros curam. Nada cura.

CIcatrizes são feitas para serem lembradas, para demonstrar que somos frágeis, e que sim, nossas atitudes têm consequências.

Cicatrizes caminham lado a lado, expostas ou já contidas.

Sou feito de cicatrizes, físicas e emocionais. E sei que muitas outras ainda virão. A colcha de retalhos ainda não está completa, faltam muitos pedaços a serem remendados até que a obra possa ser vista como prima.

Qual será a próxima?

Mais uma física?

Ou uma emocional para dar continuidade ao ciclo?

Quando surgir o momento, a escolha será minha. E certamente eu tomarei a decisão que fará meu espírito crescer ainda mais.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Diariamente

A mesma perspectiva cimentada
Julgada pelo mesmo ponto de vista
Diariamente, pelos últimos 9 meses

A tinta descasca
O video embassa e trinca
O concreto desgasta,
Transforma-se em pó.

Colisões no tráfego
Sinais verdes queimados
Vagabundos empilhados
Sofrimento enfadonho.

Uma tela de Monet cinzenta
Vida morta, alma singela.
Espectros efêmeros.

A perspectiva cansa
Perde o brilho e esmorece.

Os olhos continuam. Readaptam-se.
Merecem outra paisagem.
Mas quando?

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Tem Muito Aqui Dentro

Cúbiculo de merda. Pessoas aleatórias, sem nada de significante para dizer ou para acrescentar.

Às vezes seria melhor mesmo pegar minha bagagem e cair fora daqui, sem rumo, sem destino, sem lenço e deixar os documentos em algum canto. Espero que alguém os rasgue, não precisarei deles de qualquer maneira. Não quero ser conhecido, quero misturar-me a plateia de palhaços divergentes que não sabem o que pensar.

Fantoches de suas próprias vidas tediosas. Chega. Quero sair. Para o trem, para o mundo, gire o mundo ao contrário, quem sabe assim as coisas melhorem e passe a existir algum sentido, que há muito está incubado em cada um de nós.

Nada de amores. Sem dores, sofrimento, decepções. Ah, frustrações? O que é frustração? Nunca tive contato com essas palavras, quisá com o sentimento que ela desperta em mim ou em outrém.

A banda deveria tocar assim. Sem regras. De acordo com o que cada um precisa, de acordo com o que cada um quer, na ritmica que quiser, sem letras, sem maestro ou regente, sem limites. Limites restringem, emburrecem, estristecem, enfim, limitam.

Pare de pensar por um instante e me diga, realmente, você é feliz? Ou você vive em função do que acha que é a felicidade? Você faz o que quer? Ou faz aquilo que foi programado a fazer? Você sorri para quem quer? Ou sorri para manter as aparências e se integrar ao coletivo? Você acha mesmo que eu dou a mínima para você? Pare e pense. Pense. Reflita mais um pouco e depois volte a falar comigo.



Meu, para o mundo.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Dislexia Textual

“o bilhete entrou flutuando pela janela. O recado era inilegível, uma série de grafismos surrealistas enfeitados com arabescos firmemente delineados.”

“a janela estava aberta, o cursor piscava initerruptamente durante a conversa telefônica que perdurou por horas. Outra janela piscava minimizada, laranja pulsante. Maximizada, a imagem da câmera mostrava uma bandeira com um Sagrado Coração de Jesus estampado em silk.”

“ao tentar atravessar a rua, pisou na faixa recém-pintada com cal, sujou a sola de seu tênis recém-comprado e voltou para sua casa, recém-reformada.”

“de tudo o que foi dito, suspiros, somente, foram processados.”




Meu, para o mundo.

sábado, 24 de abril de 2010

Vinte e Quatro de Abril de Dois Mil e Dez

Hoje fazem exatamente Três Meses e Cinco Dias.

O tempo passou mais rápido do que pudesse sentir. As horas, algumas foram eternamente longas, já outras passaram fugazes como um trem bala, ou melhor, como uma bala.

O tempo. Mesmo com estes Noventa e Seis Dias nas costas e na mente todos os dias, parece que faz completou muito menos. Cada mês para uma semana, e cada semana para um dia.

E quando esse sentimento sobressai, o dia demora a concluir-se. Os pensamentos ficam soltos pelo ar, desatam-se os nós dos neurônios e quem diz que as sinapses podem fazer algum sentido? Ou que elas são geradas de alguma maneira?

O tempo escorre por entre os dedos. E entre os dedos não existe mais nada. Só restou um coração danificado que agora não vê propósito em bater, a não ser pelo simples mérito de manter o corpo de seu dono em pé.

Talvez o tempo venha a ajudar de alguma maneira, àquela que ainda não surgiu e está ansiosa por mostrar sua face e acolher os tormentos e anseios do rapaz que não vê objetivo em ter uma vida.

De tempos em tempos, ele se deixa levar pelo tempo, faz pouco caso desse fiel amigo que nunca te abandonou, mesmo nas horas mais sombrias e angustiantes de sua não-tão-grande-vida.

Duas Mil Trezentas e Quatro Horas. Isso é tempo demais para viver aprisionado em um casúlo, mas talvez seja o necessário para que a lagarta transforme-se na mais bela borboleta já vista. Talvez seja o período de amadurecimento que ele precisa ter para, enfim, encarar o mundo novamente, de peito aberto, olhos atentos e cabeça em riste.

Mas de uma coisa ele é certo: de cada um desses Cento e Trinta e Oito Mil Duzentos e Quarenta Minutos, ele sentiu falta dela em cada um deles.



Meu, para o mundo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Resiliência do Coração

Cada dia que passa sinto meus pés sempre mais afastados do chão. O ar estacionado na atmosfera nunca infla meus pulmões. Os raios solares nucna atingem minha retina. A chuva nunca toma a minha pele. As músicas nunca estouram em meus tímpanos. As buzinas dos veículos e motos não mais me irritam.

Me sinto distante, ao tempo em que meu cérebro e corpo tornam-se resilientes.

Inabalával.

Não me sinto eu. Sou apenas o reflexo de algo que quero ser, um amálgama de uma alma que já tinha com a que está nos meandros do agora.

Inevitabilidade.

Transmutação constante.

As flores na derme compravam essa transformação.

Recente. Em pausa.

E nada distante.




Meu, para o mundo.

domingo, 11 de abril de 2010

A Lua Nunca É Maior que o Polegar

Queria que o mundo hoje fosse meu.
Meu por completo,
Repleto de alegria.
Talvez um pouco menos seleto.

Queria que o mundo amanhã fosse seu.
Seu por inteiro,
Nada sorrateiro
E que te felicitasse ao acordar.

Queria que o mundo ontem fosse nosso.
Mundo pela metade,
De menor seriadade
Mais acolhedor e amistoso.

Quero, ao acordar, que o mundo seja meu.
Com o resto que ainda existe de você.
O pouco que sobrou,
Mas que mesmo hoje, me emocionou.


Meu, para o mundo.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Quase 22 Meses

“Acordei e vi.

Vi nós dois no jardim, eu abraçando você, com o queixo encostado no seu ombro. Na sua mão a sempre presente xícara de café matinal e um pires com bolachas de água e sal. Beijei seu rosto delicadamente, seus lábios se fecharam e um vasto sorriso tomou conta de seu semblante.

Alegria. Era esse o sentimento que apossou-se do meu corpo naquele exato instante. Você colocou a xícara estrategicamente na mesa que tínhamos acabado de comprar, virou-se para mim e beijou longamente. Afastei um pouco seu rosto do meu, para admirar você como sempre faço todos os dias ao acordar.

Adoro ver você dormindo. Seu rosto afundado no travesseiro, com o edredon puxado até o pescoço, deixando aparente apenas os cabelos com as mechas californianas mais atraentes do mundo.

Tem um fio na frente dos seus olhos que eu ajeito para trás da orelha, aproximo meu rosto do seu, toco sua bochecha com meu nariz, seu lábio se expande, delineando um sorriso, aquele no qual você não deixa os dentes aparecerem, tão lindo quanto o outro, tão cativante quanto todos que você já deu para mim. Sussurro algo no seu ouvido, a resposta é praticamente automática. Me despeço com um beijo e vou para a sala.

Abro o computador, começo a degladear com os teclas. O prazo está esgotando e nem 10 páginas do livro eu tenho. Preciso correr contra o tempo. Você surge na porta, como sempre fazia na casa dos seus pais. Deseja bom dia, a xícara de café quente sempre em mãos, independente do horário. É rito, pode ser às 12h, às 13h, às 14h, o dia só começa depois que você toma o seu café.
(Me pergunto se hoje em dia continua sendo assim.)

Você se senta ao meu lado, tenta bistolhotar o que estou escrevendo mas digo que só mostrarei depois de pronto. Surge o biquinho. Ah!, o biquinho. Mas ele logo passa. Sei que é só charme, e você sabe que assim que estiver terminado, nem que seja o primeiro capítulo, eu irei permitir que leia.

O botão do controle é pressionado, você seleciona o mesmo canal de sempre. São 13h. Friends está passando. Você olha pra mim, dá uma risadinha, eu retribuo com um sorriso e nos beijamos.”

Todos os finais de semana têm sido assim desde que nos conhecemos.

Agora, cada um acorda em sua casa, eu na minha cama, não mais no colchão na sua sala. Você não tem o cabelo ajeitado e nem dá aquele sorriso quando sente minha mão percorrendo sua face. Não recebe o beijo na bochecha nem o afago do nariz.

Eu acordo no meu quarto, já pensando em você, e no que fazer para preencher mais um final de semana em que não vou deixar você no teatro e rumar sentido ao shopping para passar o tempo e esperar a hora de ir te buscar.

O tempo demora a passar. As saídas continuam sendo boas, mas não tanto quanto seriam se estivesse ao seu lado, aproveitando o ponteiro do relógio passar junto a você.

Nossas mãos dadas, os dedos devidamente entrelaçados, cada um já sabendo a qual lugar pertence na disposição. O braço circundado na cintura, trazendo você mais perto de mim, encaixando-te embaixo da minha “asa”, te protegendo do mal do mundo e das malezas humanas.

A minha favorita segue sozinha, agora. Cresceu, criou asas e está migrando para outros lugares, conhecendo novas pessoas, vivendo novas experiências. Orgulho. Independentemente do que suceder, é o que sinto. Orgulho e amor. Incondicionais.

São poucas as pessoas que queremos carregar para sempre nesta vida. Ando preferindo a qualidade à quantidade. Poucos e bons à muitos e ruins. Sempre pensei assim, mas o passar dos anos aflora ainda mais esse pensamento.

Agora, chamar uma mulher de “a mulher da minha vida”, isso é para muito poucos.


Meu, para o mundo.

sexta-feira, 12 de março de 2010

Inconformidade Interna

Não existe mais espaço para bondade.

O mundo está completamente deturpado. Que abram os olhos e vejam a sua veia pulsante de crueldade antes que seja tarde demais. O passado é negro, o presente é obscuro ao extremo e o que será do futuro? O apocalipse? Não em sua real terminologia, mas aquele que dizem ser predito pela Bíblia. O famoso “Fim dos Dias”. O mesmo previsto pela civilização Maia, e que cada dia está mais perto de acontecer.

Solidariedade já deixou de fazer parte do vocabulário mundial, agora a “Lei da Selva” não se aplica mais à fauna, quem tiver dinheiro detém poder, e com poder, faz-se muito, inclusive atrocidades. Estas recorrentes no dia-a-dia da nação mundial. Mas vamos fechar o escopo apenas no Brasil.

Quando foi a última vez que você leu o jornal e não deu de cara com alguma matéria noticiando uma tragédia? Morte? Homicídio? Desastres naturais? Em menos de 1 semana, o Chile sofreu dois terremotos, ambos de magnitude considerável, o desastre não foi tão forte como em Porto Príncipe, no Haiti, mas resultou em mortes da mesma forma. Famílias desabrigadas, que de uma hora para outra perderam tudo o que batalharam anos para conquistar.

Não adianta. Podemos ficar inconformados, mas essas acontecimentos fogem ao nosso alcance. Não temos o controle, o destino está jogado a sorte da roleta russa, só que neste caso, o tambor está sempre carregado com 6 balas, e não apenas 1. Alguém, em algum lugar do mundo, em qualquer beco, viela ou avenida, vai sofrer as consequências do puxa. do gatilho.

Difícil é conviver em um mundo onde a impunidade está em alta, tanto quanto a fome e os índices de soro positivo nas nações africanas, tanto quanto o número de desempregados e desabrigados na nação brasileira, pátria amada. Repleta de ninhos de cobra e corjas das mais variadas laias.

Como salientado, quem tem dinheiro, consequentemente tem poder, e com poder, ha!, digamos que Maomé nunca precisará ir à montanha, se é que entenderam a analogia.

Triste acordar com a certeza de que vai ser mais um dia como todos os antecessores. Mais um dia de páginas vermelhas com notícias de tragédia, assassinatos que nunca serão resolvidos e os autores nunca serão encontrados, quem dirá julgados. Mais um dia de catástrofes naturais, muitas das quais nem sabemos que existe, mas creiam, elas acontecem.

É inevitável, assim como pagar taxas e a morte.

Nunca teremos controle. Infelizmente.

O que nos resta é recolher os pedaços estilhaçados da pouca dignidade que os outros têm e tentar ajudá-los a se pôr de pé.

Quem a morte de mais um paulista, um homem íntegro, sério, inteligentíssimo, que botava um sorriso diário naqueles que liam suas tiras, que dava um sopro de alegria em um mundo tão perturbador e acomodado com suas mazelas, que a morte desse cartunista, ainda jovem, não tenha sido em vão e sirva como um despertar catártico a todos.

Vai em paz, Glauco, com Geraldão, Geraldinho e sua turma.


Meu, para o mundo.

terça-feira, 9 de março de 2010

Semeando, no Meio, o Fim

Duas palavras trocadas
Dois insultos lançados
Duas vidas distanciadas

Um coração no chão
Outro escorado na parede
Ambos sem sentimentos
E agora, sem pulsação

Remorso ácido
Corroendo o que foi bom
Deixando apenas frustração
Que belo dom

Sinapses incessantes
Delirantes, emergentes
Dormentes
Dor lancinante

Esperança maior
Em busca de algo melhor
Mas o melhor é ti,
O bem que tive, o esplendor.

Loucura dominante
Minha mente latejante
Disparando contra mim
Não quero que tenho um fim

Faz tempo
Mais do tempo que me lembro
Você se afasta de mim
Isso é o entremeio pra mim

Não vá. 
Fique. Me xingue
Me agrida
Verbal ou fisicamente
Mas fique comigo

Posso querer ser mais que um amigo
Mas, contigo, sou o que puder
O que bem quiser
Seja como vier.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Rabisco de um Arrisco

Arrisco sem medo
Sem anseio
Nem receio

Arrisco por mim
Por todos
E, em vão, por ninguém

Arrisco pelos dias nublados
Nem tanto nos ensolarados
E veementemente nos misteriosos

Arrisco pelo futuro do ontem
O passado do presente
E o hoje do amanhã

Arrisco com o punho em riste

Coração latejante no peito recente
Na alma calejada de incertezas

Arrisco por não temer
Por querer viver
E ter histórias para versar

Arrisco por arriscar
No risco de flagelar
Na dúvida de alcançar

Arrisco em pé
Deitado na malha fina
Serpenteado de flores murchas

Arrisco na vida
Desafiando a morte
Rindo do infortúnio

Arrisco pela passagem
Pelo prazer da viagem
Vagando sem bagagem

Arrisco sem a pele do corpo
Trocados no bolso
Caderneta na mão

Arrisco no traço
Zombando do embaraço
Elucubrando sentidos

Risco o arrisco
De risco arriscado
Arriscando o riscado
Rasgando os riscos

Arrisco de leve
Odiado na neve
Branca de gelo.

A homenagem à ela

Ao abrir os olhos
Os teus mergiram com os dela
Um largo sorriso se anunciou
No rosto calmo e sereno.

Marejou copiosamente
As lágrimas trilharam rosto abaixo
Recaíram sobre sua bochecha
E ela, delicadamente,
Enxugou com o manto que a cobria.

Assim foi que veio ao mundo
O pequeno-grande-futuro fruto
A união do amor e da paixão
De um laço vivido a fundo.

Os dedos entrelaçados
A mão gigante, deslizante
Uma menor, desprotegida
Encontrou um berço confortante

O primeiro aniversário
O primeiro sorriso
O primeiro amor
E a primeira paixão
Tudo necessário

O remédio para os maus dias
E para os outros melhores
Para os anos difíceis
E o apoio de muito maiores

Um porto
Um seguro
Um abraço
Um feixe de luz no escuro

Nasce menina
Torna-se garota
Transforma-se em moça
E evolui para mulher.

Ela é filha
Amiga, tia
Mãe, avó.

Acima do sempre
Ao lado da gente
Indispensável, ontem
Inseparável, hoje
E irrevogável, amanhã.

Mulher forte
Mulher fraca
Mulher mulher.

O elo lindo
O cadeado mágico
O ladrilho especial
A peça essencial.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Roleta de Sarjeta

A garrafa de roleta russa
Acerta um,
Acerta dois,
E falha no terceiro.

Sorte de principiante?
Ou lampejo de mandante?

O vidro estilhaçado no chão
Ao lado do saco de pão
Margeando a sarjeta suja
Onde outrora sentou um irmão

Frio. Desalento e desatento.

Bateu a chave na porta
Confundiu a maçaneta
Com a linha torta

Ouviu o estalido do contato
Os pólos se conectaram
E o álcool subiu-lhe pelo olfato.

Esse foi o começo
Do meio que chegou ao fim,
Sem ter nem por onde iniciar
Ao som de Partimpim.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Entre 8 minutos

1:00.

Meio tarde pra escrever.

Mas quem foi que disse que existe um horário para começar a escrever? O que entenderia essa pessoa do ato de escrever?

Tem quem escreva pela manhã, com o sol raiando no horizonte e aquele frescor matinal adentrando a janela recém aberta, com suas cortinas ainda esvoaçantes da primeira lufada de ar depois de uma noite de repouso e uivos.

Tem quem escrevea pela tarde, durante seu tempo ocioso no trabalho, ou assim que chega da escola, da faculdade ou de qualquer outra atividade extra curricular. Tem as meninas que escrevem em seus diários, contam suas paixões crônicas, seus anseios e desesperos pelo rapaz novo que acaba de entrar no colégio e reza para que ele apaixone-se por ela. Tem aquele rapaz revoltado, no auge de seus 15 anos, com a mente ainda inocente, mas ávido em ser transgressor, agir contra tudo e contra todos, sem se importar com as consequências que mal sabe que essas, ah, essas ainda vão segui-lo por muito tempo.

Tem aqueles que só rabiscam palavras aleatórias, nas quais é possível detectar uma infinidade de sentimentos e uma imensidão de significados. Qualquer pessoa que saiba ler caligrafias pode dizer o que representa um corte diferente na letra T, ou o que expressa extender a perna da letra G ou o que diz a ausência de um pingo na letra I.

Escrever é uma arte, da qual a prática faz parte. E como toda arte, demora-se um tempo para adquirir o conhecimento necessário, empregar as pontuações nos momentos certos, saber quando acentar um A com crase ou quando deixar essa crase para um próximo momento, utilizar um sinônimo para que a mesma palavra não se repita antes do próximo parágrafo.

Detalhes. Como na pintura, a escrita é cheia de nuances e diz mais quando enxerga-se o micro, ao invés do macro.

1:08.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Impiedosa Valentia Reclusa

Momento de transição

Do pensamento e da criação

Criação infinita

Mais crente e finita.


Mudanças na mente

E na alma recente

A posiçao da mesa é diferente

Nada instigante e pouco latente.


A janela me chama

O asfalto me sacode

Meus pés estão flutuantes

Cada lugar é um piso falso.


Carreira, de dominós

Só pode ser.

Um cai e derruba o próximo

Sobrando apenas um desnorteado.


Enxergar o mundo através da lente

Ver o sol nascente

Registrar o instante recente

E viver. Para sempre.

Cada dia mais valente.



Meu, para o mundo.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

Do Sentado ao Choro para o Sono

E a janela clareou

Seus olhos se abriram

Para o mundo ver mais lindo


Revirou-se no sofá

Pegou o controle

E mudou de canal


Nada na programação matinal

Apenas o pensamento

Constante e sincero

Da saudade a repetir em loop


Uma saudade suntuosa

Cheia de camadas

E repleta de desníveis


Pôs-se sentado

De frente para o tubo de imagens

Faltou-lhe o ar nos pulmões


Agarrou-se ao remoto

E teclou números aleatórios

Sem nada que gostasse

Desligou a televisão


Reuniu forças pra levantar

Mas seu corpo estava fraco

Perene, como se estivesse morto


Seu pensamento viajou mais um pouco

Glândulas começaram a processar a vida

Serrou os olhos por um momento


Tempo suficiente para que a primeira

Começasse a descer a ladeira da epiderme.


Soluçou como uma criança

Copiosamente e sem guarda


O escudo tinha se quebrado

O coração estava confuso

Profusamente saudosista


Recolheu suas pernas para cima

Jogou a manta sobre seu corpo

Serrou os olhos lagrimais

E entregou-se a Morfeu

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Existencialismo da Brancura

Espere chegar aos céus e ver o que ele tem de bom e de melhor.

No meio do caminho, não esqueça de apreciar as nuvens em toda sua complexidade, suas formas descontruídas que abismam os terrestres e os entretem por horas em uma tarde ensolarada no parque, enquanto apontam para as construções incongruentes e disformes que revelam formatos conhecidos do senso comum incrustado em seus cérebros.

Toque os fenos plumosos-consistência mole que remetem a sua infância adocicada e as infindáveis horas em que ficava perambulando pelos brinquedos, montanhas russas, teleféricos.

O céu é infinito. Disso não tenha dúvida. Sua imensidão jamais será medida. Raio e diâmetros são desconhecidos. A magia encontra-se exatamente no desconhecido. Esse sentimento antagônico de angústia e tranquilidade responsável por extasiar a cada dia um mundo de possibilidades proporcionadas por flocos gigantes e de massa indefinada.

Orgânica, espacial, transcendentalista. Supranatural, vital e primordial. Cimo dos povos e cúpula divisora com o resto do universo, que impede a observação da atmosfera.

Além da tela azul clara dos dias acalmantes, além da pintura cinzenta dos dias nebulosos e instigantes, além da tela azul escura das noites quentes e secas que despertam os mortais de vidas monótonas e convida-os a aproveitar a vida sob uma pincelada de profusão curiosa, além da tela azul que abraça os sonhos dos inertes e mumificados pelos lençóis-cobertores-edredons. Além culminante da sabedoria popular, abriga mistérios e nuvens de incerteza.

O sincretismo eleva todos aos céus, atravessar as nuvens rumo ao desconhecido, rumo ao que a inteligência humana está aquém de poder compreender, medir e sentir em sua totalidade. Signficativamente, expressivamente, ludicamente.

Aguarde por mais longínquos anos.

O tempo vem para cada um no momento certo. Espreita pelas frestas das portas, por entre o concreto e a madeira do batente das portas de banheiros, de quartos, de cozinhas.

O tempo de concretização da caminhada pelos infinitos campos brancos. Pelas passadas almofadadas, pela fusão da pele com a matéria espessa e fofa. O entrelaçar das falanges com o algodão doce das alturas.

Resta muito pouco.

Ou talvez seu tempo terreno seja extenso e não se possa sequer ver o fim na linha do horizonte.

Devaneie sobre o inexplicável. Entregue-se ao descobrimento das figuras submersas na neve aérea. Deixe se levar pela maravilhosa sensação que envolve sua alma e acalenta seus olhos.

O céu está sempre brilhando.

Azul claro-escuro-cinza-neón-nuvem-céu-fofo-suave.

Erga as mãos e sinta a leveza das espumas brancas na palma de sua mão.

Perca-se na imensidão dos pensamentos, esqueça os bens materiais, as roupas, seu carro, sua moto, seu apartamento, seu computador, sua televisão, suas mídias sociais, seu dinheiro. Entregue-os. De corpo e alma. Sem recear o futuro-momento turvo.

Abra os braços e o coração. Experimente. Frequente esse lugar sempre que quiser.

Feche os olhos e meça o peso na palma de sua mão. Meça o que realmente importa.

O céu está está livre para admiração de todos.

Crentes, descrentes, agnósticos, budistas, xintoístas, taoístas, católicos, judeus, muçulmanos, hindus, evangélicos, protestantes ou indiferentes. Desacreditados e idealistas. Trabalhadores e artistas. Músicos e letristas. Literários e mestrados. Graduados e analfabetos.

A apreciação vem do coração, e para isso, as leis dos homens não importa. Apenas o sentimento comanda. Quem dita as leis e escrevre-as é a sensação, o olhar, a percepção, a emoção.

Liberte-se das amarras do senso comum e desperte para o infinito.

Para o improvável, o irremediável, o inevitável, o incrível.

O céu está muito próximo de estar longe do toque dos dedos.

Ele está para todos que quiserem.

E para todos que quererem.

Todos. E para nenhum.

Céu anis-cinza-azul-chuvoso-pardo-poente-expoente-no horizonte sem fim.


Meu, para o mundo