sexta-feira, 26 de março de 2010

Quase 22 Meses

“Acordei e vi.

Vi nós dois no jardim, eu abraçando você, com o queixo encostado no seu ombro. Na sua mão a sempre presente xícara de café matinal e um pires com bolachas de água e sal. Beijei seu rosto delicadamente, seus lábios se fecharam e um vasto sorriso tomou conta de seu semblante.

Alegria. Era esse o sentimento que apossou-se do meu corpo naquele exato instante. Você colocou a xícara estrategicamente na mesa que tínhamos acabado de comprar, virou-se para mim e beijou longamente. Afastei um pouco seu rosto do meu, para admirar você como sempre faço todos os dias ao acordar.

Adoro ver você dormindo. Seu rosto afundado no travesseiro, com o edredon puxado até o pescoço, deixando aparente apenas os cabelos com as mechas californianas mais atraentes do mundo.

Tem um fio na frente dos seus olhos que eu ajeito para trás da orelha, aproximo meu rosto do seu, toco sua bochecha com meu nariz, seu lábio se expande, delineando um sorriso, aquele no qual você não deixa os dentes aparecerem, tão lindo quanto o outro, tão cativante quanto todos que você já deu para mim. Sussurro algo no seu ouvido, a resposta é praticamente automática. Me despeço com um beijo e vou para a sala.

Abro o computador, começo a degladear com os teclas. O prazo está esgotando e nem 10 páginas do livro eu tenho. Preciso correr contra o tempo. Você surge na porta, como sempre fazia na casa dos seus pais. Deseja bom dia, a xícara de café quente sempre em mãos, independente do horário. É rito, pode ser às 12h, às 13h, às 14h, o dia só começa depois que você toma o seu café.
(Me pergunto se hoje em dia continua sendo assim.)

Você se senta ao meu lado, tenta bistolhotar o que estou escrevendo mas digo que só mostrarei depois de pronto. Surge o biquinho. Ah!, o biquinho. Mas ele logo passa. Sei que é só charme, e você sabe que assim que estiver terminado, nem que seja o primeiro capítulo, eu irei permitir que leia.

O botão do controle é pressionado, você seleciona o mesmo canal de sempre. São 13h. Friends está passando. Você olha pra mim, dá uma risadinha, eu retribuo com um sorriso e nos beijamos.”

Todos os finais de semana têm sido assim desde que nos conhecemos.

Agora, cada um acorda em sua casa, eu na minha cama, não mais no colchão na sua sala. Você não tem o cabelo ajeitado e nem dá aquele sorriso quando sente minha mão percorrendo sua face. Não recebe o beijo na bochecha nem o afago do nariz.

Eu acordo no meu quarto, já pensando em você, e no que fazer para preencher mais um final de semana em que não vou deixar você no teatro e rumar sentido ao shopping para passar o tempo e esperar a hora de ir te buscar.

O tempo demora a passar. As saídas continuam sendo boas, mas não tanto quanto seriam se estivesse ao seu lado, aproveitando o ponteiro do relógio passar junto a você.

Nossas mãos dadas, os dedos devidamente entrelaçados, cada um já sabendo a qual lugar pertence na disposição. O braço circundado na cintura, trazendo você mais perto de mim, encaixando-te embaixo da minha “asa”, te protegendo do mal do mundo e das malezas humanas.

A minha favorita segue sozinha, agora. Cresceu, criou asas e está migrando para outros lugares, conhecendo novas pessoas, vivendo novas experiências. Orgulho. Independentemente do que suceder, é o que sinto. Orgulho e amor. Incondicionais.

São poucas as pessoas que queremos carregar para sempre nesta vida. Ando preferindo a qualidade à quantidade. Poucos e bons à muitos e ruins. Sempre pensei assim, mas o passar dos anos aflora ainda mais esse pensamento.

Agora, chamar uma mulher de “a mulher da minha vida”, isso é para muito poucos.


Meu, para o mundo.

sexta-feira, 12 de março de 2010

Inconformidade Interna

Não existe mais espaço para bondade.

O mundo está completamente deturpado. Que abram os olhos e vejam a sua veia pulsante de crueldade antes que seja tarde demais. O passado é negro, o presente é obscuro ao extremo e o que será do futuro? O apocalipse? Não em sua real terminologia, mas aquele que dizem ser predito pela Bíblia. O famoso “Fim dos Dias”. O mesmo previsto pela civilização Maia, e que cada dia está mais perto de acontecer.

Solidariedade já deixou de fazer parte do vocabulário mundial, agora a “Lei da Selva” não se aplica mais à fauna, quem tiver dinheiro detém poder, e com poder, faz-se muito, inclusive atrocidades. Estas recorrentes no dia-a-dia da nação mundial. Mas vamos fechar o escopo apenas no Brasil.

Quando foi a última vez que você leu o jornal e não deu de cara com alguma matéria noticiando uma tragédia? Morte? Homicídio? Desastres naturais? Em menos de 1 semana, o Chile sofreu dois terremotos, ambos de magnitude considerável, o desastre não foi tão forte como em Porto Príncipe, no Haiti, mas resultou em mortes da mesma forma. Famílias desabrigadas, que de uma hora para outra perderam tudo o que batalharam anos para conquistar.

Não adianta. Podemos ficar inconformados, mas essas acontecimentos fogem ao nosso alcance. Não temos o controle, o destino está jogado a sorte da roleta russa, só que neste caso, o tambor está sempre carregado com 6 balas, e não apenas 1. Alguém, em algum lugar do mundo, em qualquer beco, viela ou avenida, vai sofrer as consequências do puxa. do gatilho.

Difícil é conviver em um mundo onde a impunidade está em alta, tanto quanto a fome e os índices de soro positivo nas nações africanas, tanto quanto o número de desempregados e desabrigados na nação brasileira, pátria amada. Repleta de ninhos de cobra e corjas das mais variadas laias.

Como salientado, quem tem dinheiro, consequentemente tem poder, e com poder, ha!, digamos que Maomé nunca precisará ir à montanha, se é que entenderam a analogia.

Triste acordar com a certeza de que vai ser mais um dia como todos os antecessores. Mais um dia de páginas vermelhas com notícias de tragédia, assassinatos que nunca serão resolvidos e os autores nunca serão encontrados, quem dirá julgados. Mais um dia de catástrofes naturais, muitas das quais nem sabemos que existe, mas creiam, elas acontecem.

É inevitável, assim como pagar taxas e a morte.

Nunca teremos controle. Infelizmente.

O que nos resta é recolher os pedaços estilhaçados da pouca dignidade que os outros têm e tentar ajudá-los a se pôr de pé.

Quem a morte de mais um paulista, um homem íntegro, sério, inteligentíssimo, que botava um sorriso diário naqueles que liam suas tiras, que dava um sopro de alegria em um mundo tão perturbador e acomodado com suas mazelas, que a morte desse cartunista, ainda jovem, não tenha sido em vão e sirva como um despertar catártico a todos.

Vai em paz, Glauco, com Geraldão, Geraldinho e sua turma.


Meu, para o mundo.

terça-feira, 9 de março de 2010

Semeando, no Meio, o Fim

Duas palavras trocadas
Dois insultos lançados
Duas vidas distanciadas

Um coração no chão
Outro escorado na parede
Ambos sem sentimentos
E agora, sem pulsação

Remorso ácido
Corroendo o que foi bom
Deixando apenas frustração
Que belo dom

Sinapses incessantes
Delirantes, emergentes
Dormentes
Dor lancinante

Esperança maior
Em busca de algo melhor
Mas o melhor é ti,
O bem que tive, o esplendor.

Loucura dominante
Minha mente latejante
Disparando contra mim
Não quero que tenho um fim

Faz tempo
Mais do tempo que me lembro
Você se afasta de mim
Isso é o entremeio pra mim

Não vá. 
Fique. Me xingue
Me agrida
Verbal ou fisicamente
Mas fique comigo

Posso querer ser mais que um amigo
Mas, contigo, sou o que puder
O que bem quiser
Seja como vier.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Rabisco de um Arrisco

Arrisco sem medo
Sem anseio
Nem receio

Arrisco por mim
Por todos
E, em vão, por ninguém

Arrisco pelos dias nublados
Nem tanto nos ensolarados
E veementemente nos misteriosos

Arrisco pelo futuro do ontem
O passado do presente
E o hoje do amanhã

Arrisco com o punho em riste

Coração latejante no peito recente
Na alma calejada de incertezas

Arrisco por não temer
Por querer viver
E ter histórias para versar

Arrisco por arriscar
No risco de flagelar
Na dúvida de alcançar

Arrisco em pé
Deitado na malha fina
Serpenteado de flores murchas

Arrisco na vida
Desafiando a morte
Rindo do infortúnio

Arrisco pela passagem
Pelo prazer da viagem
Vagando sem bagagem

Arrisco sem a pele do corpo
Trocados no bolso
Caderneta na mão

Arrisco no traço
Zombando do embaraço
Elucubrando sentidos

Risco o arrisco
De risco arriscado
Arriscando o riscado
Rasgando os riscos

Arrisco de leve
Odiado na neve
Branca de gelo.

A homenagem à ela

Ao abrir os olhos
Os teus mergiram com os dela
Um largo sorriso se anunciou
No rosto calmo e sereno.

Marejou copiosamente
As lágrimas trilharam rosto abaixo
Recaíram sobre sua bochecha
E ela, delicadamente,
Enxugou com o manto que a cobria.

Assim foi que veio ao mundo
O pequeno-grande-futuro fruto
A união do amor e da paixão
De um laço vivido a fundo.

Os dedos entrelaçados
A mão gigante, deslizante
Uma menor, desprotegida
Encontrou um berço confortante

O primeiro aniversário
O primeiro sorriso
O primeiro amor
E a primeira paixão
Tudo necessário

O remédio para os maus dias
E para os outros melhores
Para os anos difíceis
E o apoio de muito maiores

Um porto
Um seguro
Um abraço
Um feixe de luz no escuro

Nasce menina
Torna-se garota
Transforma-se em moça
E evolui para mulher.

Ela é filha
Amiga, tia
Mãe, avó.

Acima do sempre
Ao lado da gente
Indispensável, ontem
Inseparável, hoje
E irrevogável, amanhã.

Mulher forte
Mulher fraca
Mulher mulher.

O elo lindo
O cadeado mágico
O ladrilho especial
A peça essencial.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Roleta de Sarjeta

A garrafa de roleta russa
Acerta um,
Acerta dois,
E falha no terceiro.

Sorte de principiante?
Ou lampejo de mandante?

O vidro estilhaçado no chão
Ao lado do saco de pão
Margeando a sarjeta suja
Onde outrora sentou um irmão

Frio. Desalento e desatento.

Bateu a chave na porta
Confundiu a maçaneta
Com a linha torta

Ouviu o estalido do contato
Os pólos se conectaram
E o álcool subiu-lhe pelo olfato.

Esse foi o começo
Do meio que chegou ao fim,
Sem ter nem por onde iniciar
Ao som de Partimpim.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Entre 8 minutos

1:00.

Meio tarde pra escrever.

Mas quem foi que disse que existe um horário para começar a escrever? O que entenderia essa pessoa do ato de escrever?

Tem quem escreva pela manhã, com o sol raiando no horizonte e aquele frescor matinal adentrando a janela recém aberta, com suas cortinas ainda esvoaçantes da primeira lufada de ar depois de uma noite de repouso e uivos.

Tem quem escrevea pela tarde, durante seu tempo ocioso no trabalho, ou assim que chega da escola, da faculdade ou de qualquer outra atividade extra curricular. Tem as meninas que escrevem em seus diários, contam suas paixões crônicas, seus anseios e desesperos pelo rapaz novo que acaba de entrar no colégio e reza para que ele apaixone-se por ela. Tem aquele rapaz revoltado, no auge de seus 15 anos, com a mente ainda inocente, mas ávido em ser transgressor, agir contra tudo e contra todos, sem se importar com as consequências que mal sabe que essas, ah, essas ainda vão segui-lo por muito tempo.

Tem aqueles que só rabiscam palavras aleatórias, nas quais é possível detectar uma infinidade de sentimentos e uma imensidão de significados. Qualquer pessoa que saiba ler caligrafias pode dizer o que representa um corte diferente na letra T, ou o que expressa extender a perna da letra G ou o que diz a ausência de um pingo na letra I.

Escrever é uma arte, da qual a prática faz parte. E como toda arte, demora-se um tempo para adquirir o conhecimento necessário, empregar as pontuações nos momentos certos, saber quando acentar um A com crase ou quando deixar essa crase para um próximo momento, utilizar um sinônimo para que a mesma palavra não se repita antes do próximo parágrafo.

Detalhes. Como na pintura, a escrita é cheia de nuances e diz mais quando enxerga-se o micro, ao invés do macro.

1:08.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Impiedosa Valentia Reclusa

Momento de transição

Do pensamento e da criação

Criação infinita

Mais crente e finita.


Mudanças na mente

E na alma recente

A posiçao da mesa é diferente

Nada instigante e pouco latente.


A janela me chama

O asfalto me sacode

Meus pés estão flutuantes

Cada lugar é um piso falso.


Carreira, de dominós

Só pode ser.

Um cai e derruba o próximo

Sobrando apenas um desnorteado.


Enxergar o mundo através da lente

Ver o sol nascente

Registrar o instante recente

E viver. Para sempre.

Cada dia mais valente.



Meu, para o mundo.