segunda-feira, 24 de maio de 2010

Colcha de Retalhos

Faz tempo que não te escrevo nada, sei disso, mas foi uma escolha minha. Nossos desentendimentos, mesmo sem relacionamento, já não estava me fazendo bem. Você continua seguindo sua vida, e eu a minha. Cada um em perfeita sinergia com as vibrações que planta, será melhor assim, tanto pra você quanto pra mim.

Seus olhos não passam de fotografias já desbotadas na minha mente imemorial. Seu sorriso ficou amarelo, como um aro de bicicleta que com o passar dos anos e a ação do tempo cria a ferrugem e desgasta o que antes era belo e cintilante.

Seus cabelos agora estão mais compridos, talvez mais louros, não sei.

A última vez que te vi, continuava bela, como sempre fostes, desde o nosso primeiro encontro no jardim botânico, rodeado por tantas flores, tanto verde, tanta pureza no ar. Nada tirava-me a atenção. Só parecia existir você dentro daquele parque amazônico, onde tudo fundia-se em completa harmonia. O farfalhar de cada folha daquele recinto soava como a mais maravilhosa orquestra sinfônica. Cada brisa que tocava meu rosto era um novo sopro de vida, que enchia de alegria meus pulmões já prejudicados pela minha vida de excessos.

Tem muito tempo que isso aconteceu. Hoje já não somos mais aquelas mesmas pessoas felizes e que compreendiam o que se passava na vida de ambas. Não somos mais aquele casal contente, que inspirava os outros a ser como nós. Não somos mais uma só pessoa, uma entidade contígua. Hoje, somos eu e você, separados pela ação do tempo e por acasos não feitos ao acaso. Hoje, queria que fosse o ano que vem, para que a velocidade com que o espaço-tempo passaria apagasse de minha memória teimosa a sua imagem, seus sorrisos, seus abraços, seus beijos e acalentos, suas palavras doces sussurradas ao pé do meu ouvido durante noites calorosas.

As juras de amor desfizeram-se perante os anos que se passaram. Seus gestos mostram uma faceta sua antes desconhecida pela minha visão, pelo meu coração. O que os olhos não veem o coração continua a sentir da mesma maneira. Ditos populares não servem de apoio ao que eu tenho passado, e nem são as palavras do mais chegados que vão fazer com o que os pedaços de vidro quebrados dentro de mim sejam colados, ou sequer recolhidos.

Existe muito aqui que ainda precisa ser dito, ou ao menos mostrado pra você. Não sei por onde começar, e nem como fazer você ver.

É complicado aprender a caminhar com as próprias pernas.

Dias a fio roguei por você, indaguei o porquê das coisas terem transcorrido como transcorreram, e sei que no final, quem causou tudo o estardalhaço é aquele que hoje sente em suas entranhas o cravar das lâminas afiadas da solidão.

Superar não tem sido fácil, nem tem sido agradável. Tem mostrado-se cada vez mais difícil, em um mundo frio e cada dia mais gélido com o chegar do inverno, aquecer o corpo é a tarefa mais simples, acenda uma lareira ou acolha-se embaixo de um edredon ou cobertor, agasalhe-se e o calor se encarrega de fazer sua função, de prevenir doenças, impedir a queda térmica do corpo. O problema é aquecer a alma, avivar o coração, manter acesa a chama que um dia apagou-se pelas atitudes drásticas e imaturas tomadas pelo lado infantiil da relação amorosa. Isso nem o tempo, nem as pessoas, nem nobres palavras e gestos aventureiros curam. Nada cura.

CIcatrizes são feitas para serem lembradas, para demonstrar que somos frágeis, e que sim, nossas atitudes têm consequências.

Cicatrizes caminham lado a lado, expostas ou já contidas.

Sou feito de cicatrizes, físicas e emocionais. E sei que muitas outras ainda virão. A colcha de retalhos ainda não está completa, faltam muitos pedaços a serem remendados até que a obra possa ser vista como prima.

Qual será a próxima?

Mais uma física?

Ou uma emocional para dar continuidade ao ciclo?

Quando surgir o momento, a escolha será minha. E certamente eu tomarei a decisão que fará meu espírito crescer ainda mais.

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