segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Era uma vez, um mês...

"
No mês em que o vermelho do semáforo era melhor do que o verde. No vermelho os enamorados se beijavam e as pessoas dos outros carros sabiam. E os transeuntes paravam para ver, e a moça desconfiava enquanto cantava no rádio. Todos sabiam do frescor que era cada novo beijo, e toda a malemolência das línguas salivantes e molhadas que se cruzavam antes do farol se abrir.

O mês era de lanchonetes que serviam batatas que conduziam o encostar de bocas levemente salgadas por fora, mas com o suculento adocicado de todos os milk shakes que se pode consumir nesse mês. Mesa para dois, não fumantes, donos de si e donos do mundo. Coca- cola e suco de maracujá, e um garçom que tente interromper o abraço continuo.

O mês que revelaram o número do cartão e que se deu a chave de casa em mão do outro. A casa exibia filmes pouco convencionais e a cama de um era a segunda cama do outro. O mês em que sonharam com a terceira, a primeira dos dois em par. E seguiram mãos que se deram e pés de meia no cobertor, e as pulseiras de plástico no pulso, e idéias de feriado e beijos nas costas estreladas e entrelaçadas.

Fora o mês das fotos egípcias, daquelas que só aparecem de perfil. Olhavam um para o outro, na rítmica em que os flashes cruzavam suas imagens estáticas e deliciosamente apaixonadas.
Era o mês em que todos esperam viver algum dia. E eles inesperadamente se surpreenderam com a dimensão que um sorriso pode se estender.

Era um mês feito de finais e alguns dias em semana, todo diagramados para serem executados pessoalmente ou não. A música das mensagens no celular superava a marcha nupcial, e o conteúdo ultrapassava as palavras convencionais acostumadas aos olhos e ouvidos. O mês aconteceu de noite em noite, e algum intervalo de dia se passou na estrutura de um teatro ou na frenética agência publicitária.

Naquele mês não criaram caso, não recuaram um passo sequer, não discutiram sem acentuar o humor simples que transformava o tom sério em risadas.

Era uma vez um mês em que o tempo gritou, mostrou-se relativo e envolveu em um único espaço dois corpos. Contra qualquer teoria, regra ou rebeldia. Criaram algo novo no mundo.

E depois desse mês, os caminhos não iriam se cruzar mais.
Já que agora um é o próprio caminho do outro.
"

by Maria Fernanda Loverra

Nenhum comentário: