Meu, para o mundo.
segunda-feira, 20 de junho de 2011
Entre Tragos
mais um cigarro apagado no cinzeiro. a pilha enchia progressivamente enquanto as horas entravam madrugada adentro. pouco se ouvia, menos ainda sentia naquela noite calorosa, cheia de pernilongos a sua volta e abarrotada de 'bichinhos-de-luz', era assim que conhecia aqueles insetos voadores que apegavam-se aos holofotes nas ruas desertas, que circundavam os televsiores luminosidade incessante. nunca entendeu o por quê dos insetos fazerem isso, talvez buscassem calor, talvez apenas um feixe de luz que os permitesse enxergar melhor pelas sombras da escuridão. não sabia ao certo, mas tinha uma convicção, não suportava aqueles parasitas que sonhavam ser vagalumes, mas faltava-lhes a luz no traseiro. as palavras vertiam-se de seus dedos, hora agressivas, minutos seguintes pacíficas, brandas, como a marola da maré que anuncia o recesso do oceano, apresenta ao mundo o descanso do incansável sacolejar das ondas que rumam ao seu triste e fabuloso fim na arrebentação com as pedras. o que sobraria quando o sol começasse a raiar, além de profundas olheiras e mais um texto estacionado na metade da folha em branco? serviria para preencher o vazio que esquentava o seu coração gélido? teria como continuar assim por quantos outros dias que viriam? era indefectível suas lástimas ao tocar cada tecla, perceptível solução embalada em frascos minúsculos. permanecia indelével como tinta no papel, como sangue no asfalto, permanecia inerte como o vento, que apenas seguia seu caminho até ser barrado por uma parede de concreto e, milagrosamente, encontrar um novo curso curvilíneo para prosseguir e beijar os cabelos dos que passavam, das folhas ressacadas do outono que teimavam em empoeirar as calçadas com suas pétalas marrons e alaranjadas, um prelúdio do que reservaria a primavera daqui meses a vir. impressionante causalidade da vida, perpetuando sentimentos adormecidos no negrume da alma, o buraco negro das afeições esquecidas no vale suntouso das constantes lembranças indiferentes. queria apenas um copo americano com café pela metade, pelando, para sorver as sensações desaparecidas em face dos olhares trocados que roubavam-lhe as sinapses aórticas. um gole por um amor. era o que procurava, dia após dia, incansavelmente, teimando ser possível encontrar a próxima paixão na borra do café que permaneceu no coador encostado na quina da pia, escorrendo seu suor negro pelo gabinete, manchando as portas cândidas. era permitido viver sem amar? viver sem sentir o coração acelerar? era possível que a vida não lhe quisesse retribuir o tanto que as circunstâncias já haviam tirado dele? anos passaram-se até aquele momento, até que a primeira gota salinizada rolasse de seus olhos e tocasse seu lábio. como era possível? 20 anos em flashback. estava em seu aniversário de três anos, mas agora não mais como motivo, e sim como espectador daquela festança módica, de um menino que nem sabia da existência do amor, da existência da saudade. os beijos e abraços incomodavam, mas cada um que o pequeno recebia, fazia verter mais uma lágrima nos olhos do grande. despencando no jardim, com as mãos tapandos os olhares da roda de burocratas e burgueses presentes, permanecia como podia imóvel, sem tensionar um músculo sequer. o cabelo em união metafísica com o jardim do prédio, as folhas penetrando em seus pensamentos, acariciando-lhe as mãos, unindo-se ao pesadelo permanente. nexo? aceitação? complacência? não poderia concordar com o que via, não podia conviver com a hesitação do sim temendo sempre que o não viesse primeiro. não. viver. progredir. o alarme começou a tocar. o sino da vida da manhã. o sinal da busca pela razão, que impulsionava seu tronco e pernas a guinarem da cama e prostrarem-se no chão, chumbados em uma placa de cimento que travava seus movimentos. as amarras da dúvida prendiam-no à cama, embora cada sinapse dissesse para sair, procurar e cultivar o que visse pela frente. cultive o sorriso do flanelinha, preserve o 'olá' do porteiro. nenhum tiro é certeiro, mas uma bala perdida pode encantar, despertar o eu-lírico apaixonado e dormente, o pierrot das tragédias, que sonhava apenas com o beijo da colombina.
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